DE KOONING

“Eu evito “acabá-la”. (…) E estou
sempre algures na pintura”
               - De Kooning

                               I

Se De Kooning fosse português
teríamos apenas dois quadros e seis desenhos.
Portugal – essa entidade abstrata mistura de bom e ruim – teria
como bem sabemos amordaçado o seu pescoço até ao
último sufoco. Tê-lo-ia cedo pendurado na praça do
gozo e do desprezo. Seria apenas mais um entre vários suicidas!
Tê-lo-ia silenciosamente enterrado num qualquer
cemitério de província.

Mas cinquenta anos depois teria já feito as devidas homenagens.
Nasceriam assim penas e penas escritas em antologias elogiosas.
Iria pedir a todo e qualquer poeta de serviço poemas dignos de limpar o cu.
E aos prosadores (onde andam esses?) teria pedido longas narrativas
para encher o fosso daquilo que meteu
no lixo.

Recuperado o artista era agora possível estendê-lo como
uma pastilha elástica por todo o retângulo. E assim
a pequena exposição
seria
do Norte às várias ilhas
o acontecimento do ano.
seria uma máxima ao vento uma a dizer a todos
Somos um país culto!

Mais vale uma sardinha no prato do que um De Kooning na parede!
Dirão muitos. Ora aí começa exatamente o problema…

                                  II

De Kooning para minha alegria não era português! Uffa!
E assim este poema já é possível com várias pinturas.
Antes de mais é preciso dizer que ninguém me encomendou
este poema. Os poetas não comem. São umas putas sem boca.
Este poema também é preciso dizer não vai enquadrar nenhum
artigo numa qualquer página de jornal ele não consegue ser tão
mau por isso não é aceite. E além disso convém dizer que não
se destina a cair nas boas intenções de uma galeria moderna.

Vou aqui dividir De Kooning em quatro partes essenciais
sobre as quais não vou dizer nada. Nada? Sim vou falar de
De Koonig sem falar dele. Assim vamos ter: períodos de mulheres
Desertos de 58 Carnes vivas de 60 a 70 e finalmente a belíssima
languidez dos 80.

                                     III

É preciso toda esta explicação para os meninos perceberem.
Lá está. É preciso um poema que explique aquilo que não era
suporto explicar um que diga: Senhor leitor coloque aqui o seu
pé depois a testa ali e vai em frente.
Pensando bem teria de recuar ainda mais: Quem é
afinal o De Kooning? Alguém pergunta. Bom querido leitor
vou fingir que não ouvi esta pergunta e vou continuar pode ser?
É que é cansativo ter de explicar o uso da palavra X
e Y em cada frase que se usa. Eu sei Eu sei este é
um discurso um tanto ou quanto irritante mas
tenho de ser irritante para ao chegarem ao fim
dizerem Ele tem razão! Mas se não o fizerem
não fico magoado
já estarei noutro poema
e este ser-me-á totalmente indiferente.

Não fico magoado porque lá no fundo
também conheço bem as linhas como que me coso.

                                    IV

Período das mulheres. Dona Golga ilustre defensora das
mulheres já veio a público dizer que alguns dos meus poemas
são um atentado aos bons costumes ao nome e trabalho das
mulheres. Caro Vítor Teves que tem a dizer sobre isso?
Passando os dedos pelos olhos diz:
“Misógino é coisa que nunca fui. A mulher toda
 a mulher tem todo o valor até mesmo chata da
Dona Olga que passa a vida a policiar as palavras
e as intenções dos outros. Outro dia por usar a
palavra “Mulata” fui racista. Ora “Mulata” são
as bolachas açorianas da Moaçor. São uma delícia!
Hoje sou misógino. Na quinta fui racista e amanhã
serei homofóbico coisa que o meu namorado já me tem
vindo a dizer sempre que lhe digo que o arroz tem muito sal.

Sobre o período das mulheres pouco sei confesso!
Sobre o período de De Kooning das Mulheres gosto imenso.
A minha mulher preferida é a “Mulher V” aquela que traz
o Báton esborratado. Lembra-me a Barbara Stronger à saída
da discoteca às 07h da manhã toda bêbada e descabelada.
Era uma grande Mulher!
 
                                      V

Auto-estrada de Montauk. Muita coisa acontece nas auto-
-estadas dos Estados Unidos. Mas ali não há nenhum sangue na
longa planície deserta. O deserto imenso absoluto lindo. Nele não
portas para o rio apenas o
tédio de domingo à tarde.
O Longo longo tédio de
uma longa longa
estrada.


                                      VI
Carnes de 60. Um par de Acccabonac. Como
se a carne deslizasse sozinha sem o suporte
dos ossos. Amores em espera vestidos de
pinceladas e massa cor-de-rosa.
                         
                                    VII
A languidez. A plana e lenta pincelada desce pelas
curvas do teu ventre e a sensual linha sobe ao
teu lábio superior. No caminho
a paisagem diz ao corpo:
Juntos para sempre!

                    
                                   VIII

E chego ao ponto – aqui – a este – em que tenho de
reescrever tudo. Pois está visto ser poeta e pedagogo
são águas que não se misturam.

Outro dia voltarei a De Kooning e claro
aí ninguém me vai perceber. E olha que bom!
Que libertador!




Comments

Popular posts from this blog