NOVO VELHO DO RESTELO


No passado é que era. Toda aquela
glória todo aquele poder aquele sabor
de frenéticas imagens que nos roíam
as mãos dentro dos pés. Dos louros
corpos flamejantes de metáforas dentro
de metáforas que nos desequilibravam
o fio da espinha dorsal e nos atiravam
para o chão feito charcos em pleno
verão. No passado é que era no tempo
em que eu ia à praia com o meu caderno
de fita azul e o livrinho poético brilhava
entre os dedos. Sempre entre os dedos.
No passado é que era. E hoje o mundo
está perdido totalmente perdido pois as
metáforas mirabolantes as ejaculações
precoces já não nos ferem os olhos a
dentição mais fina da pele as melodias
encantadoras e extasiantes de ser jovem.
No passado é que era. Porque a poesia
já não canta não encanta o encantamento
da vida (da jovem vida) que eu tinha em
tempos. Amanhã à mesma hora aqui no
banco e quero-te ereto como manequim
sobre belos poemas de amor e morte.
No passado é que era. No tempo em que
o tempo era sangue e a pressa aqui não
estava toda apressada dizendo o quão
lento sou o quão lento vejo e o quão
velho estou. E é aqui fechado neste frio
poço onde o tempo parou por momentos
que me sinto finalmente no trono de rico
opressor. No passado é que era porque
a poesia estava viva e hoje está morta. O
pão não tem sabor e esses meus dentes
podres já não seguram o vivo sabor das
maças. E é aos olhos que o sal faz mais
falta perderam o sabor de controlar a
melancolia e sonham a juventude perdida
e nada tem mais sabor tudo sem odor.

No passado é que era meus amigos. 


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