A FIGUEIRA DO INFERNO*
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Outro Oxónio Poema de Amor –
ÚTERO SECO I
O
Caso raro
De manhã era Génio!
Redescobrira a
pólvora a fórmula
alquímica de
salvar o homem:
pisar o poderoso
dar a mão ao pobre.
De tarde era Besta!
Negara-se a ser
marioneta ao preço
mais caro do
mercado em troca de
ser capa num qualquer
morto jornal.
ÚTERO SECO II
Terminava o longo tormento com
uma coreografia etnográfica
da terra que nunca vira.
Dizia que era só para turistas verem
com a sobranceria e o desprezo
de uma arquitrave grega.
Sempre foi mais fácil
falar de gregos e romanos
sandálias barbas por fazer
do que descer ao corpo quente
do interior da terra ao corpo
quente da vida. Essa que fica
no paralelo "invisível"
da
Atlântida.
É por nunca
chegarmos ao cerne
daquilo que só vemos em
postais
que devemos
antes de mudar o penso
higiénico
lacrar a boca.
ÚTERO SECO III
Não desejes um afogado
em casa alheia se és tu
que imitas Fedra na piscina.
Entre ter um futuro afogado
amado ou um banana por
marido prefiro o primeiro!
Porque o amado estará
sempre além da minha
agónica e mera vontade.
ÚTERO SECO IV
Dona Evelina sempre na vila
recordou a praga da mulher
fértil mãe de doze rapazes:
"Teu útero seco
é um navio
encalhado
uma figueira do inferno”
ÚTERO SECO V
Violência espontânea
era a designação proferida
quando o contra-ataque
perfurava a carapaça das
cobras dos muros das
cidadelas.
Era a hora perfeita da
dança do cirúrgico bisturi.
Era a designação
predilecta do
politicamente aceite
face à força vulcânica
de quem sozinho
contra-ataca.
ÚTERO SECO
VI
A Destruição que começa por mim?
Não! Nessa coroa enviada por ti
está sim escrito o seguinte elogio:
A Renovação que começa por ti!
ÚTERO SECO
VII
Seca-me o útil útero
esse sobre o qual estendo
frágeis tecidos de linho.
Da larga mancha
cor de vermelha romã
nenhuma gota
cairá amanhã.
Vítor Teves
30.10.2021
*Na "etnografia açoriana", as
"figueiras do inferno" são as mulheres incapazes de dar filhos, são
conhecidas nas freguesias pela azedura crónica.
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